Primeiro foi aquele que considerou tortuoso que traficantes de drogas também eram vítimas de usuários de entorpecentes. Aí veio a megaoperação das forças de segurança públicas do Rio de Janeiro, seguida de um silêncio prolongado de vários dias — em um momento em que o país não falava de outra coisa. Por fim, quando finalmente falou em público sobre a operação carioca, aprovada por cerca de 70% da população, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) limitou-se a classificá-la como desastrosa.
Em meio a uma sequência de declarações em descompasso com os anseios da maior parte da sociedade brasileiraditas de improviso sobre o tema da segurança pública, Lula viu sua popularidade recuar pela primeira vez desde maio. É o que aponta a nova pesquisa Quaest divulgada nesta quarta-feira (12). Os números mostram que 50% dos entrevistados desaprovam o governo Lula, enquanto 47% o aprovam.
Nesta quinta-feira (13), a Quaest divulgou a segunda parte da pesquisa, com as sondagens eleitorais para 2026. Nela, Lula mantém a liderança para os adversários nos cenários de primeiro turno, mas afastado a distância. Em um eventual segundo turno, onde na sondagem anterior Lula abriu vantagem fora da margem de erro sobre todos os adversários, agora ele volta a empatar técnicos com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) — que no entanto segue inelegível para o ano que vem.
Desde julho, a aprovação do governo Lula vinha oscilando dentro da margem de erro de dois pontos percentuais para cima, e a desaprovação para baixo. Agora, o cenário se inverteu: a aprovação oscilou para baixo e a desaprovação, para cima. Os entrevistados que aprovaram o governo Lula foram de 48% em outubro para 47% agora. A desaprovação passou de 49% para 50%.
Os que não souberam ou não responderam obtiveram resultados em 3% nos dois levantamentos consecutivos. A pesquisa foi encomendada pela Genial Investimentos e arrecadou 2.004 pessoas com 16 anos ou mais entre os dias 6 e 9 de novembro. A margem de erro é de 2 pontos para mais ou para menos. O nível de confiança é de 95%.
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Mancha na popularidade de Lula ocorre após episódios relacionados à segurança pública
O cenário de interrupção nas viés de alta popularidade do presidente e de seu governo petista acontece logo após três episódios relevantes, todos relacionados à segurança pública. “Toda vez que a gente fala de combater as drogas, possivelmente, seria mais fácil a gente combater os nossos viciados internamente, os usuários”, afirmou Lula a jornalistas durante viagem à Malásia, no final de outubro, ao criticar os ataques militares ordenados pelo presidente dos EUA, Donald Trump, a navios de tráfico próximos à costa da Venezuela, no Mar do Caribe.
“Os usuários são responsáveis pelos traficantes, que também são vítimas dos usuários”, disse o presidente brasileiro. A repercussão negativa foi imediata, e horas depois Lula desculpou-se com uma nota nas redes sociais, onde afirmou que a frase foi “mal colocada”.
A intenção de voto espontânea recua: as indicações a Lula caem e a maioria segue indecisa, reforçando a incerteza do cenário eleitoral, aponta Quaest.
Menos de uma semana depois, o governo do Rio de Janeiro deflagrou uma megaoperação contra a facção criminosa Comando Vermelho das favelas dos complexos da Penha e Alemão, na capital carioca — que terminou com 121 mortos, incluindo quatro policiais, e foi aprovado pela população, conforme diversos institutos de pesquisa.
Lula evitou o tema por vários dias e, quando o abordou, ao ser questionado por jornalistas estrangeiros durante a COP 30 em Belém, foi para classificar o episódio como “matança” e “desastroso”. Segundo a Quaest, a megaoperação policial no Rio e as declarações de Lula frearam a melhoria na avaliação do governo. Os indicadores estão em empate técnico pelo segundo levantamento consecutivo, após a aprovação e a desaprovação voltarem a empatar em outubro, pela primeira vez desde janeiro.
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Falta de ação interrompida ou “lua de mel” entre Lula e eleitor independente
A situação não surpreende em uma sociedade na qual a maioria, 38% segundo a sondagem da Quaest, considera a violência o principal problema do país. A pesquisa mostra ainda que, além da maioria apoiar a megaoperação carioca, 57% discordam de Lula sobre a operação no Rio ter sido desastrosa. Sobre os traficantes também sendo vítimas dos usuários, 81% dos entrevistados discordam do presidente.
“Se a tarifaço (imposto pelos EUA a uma série de produtos brasileiros) mudou a trajetória da aprovação a favor de Lula, a pauta da segurança pública interrompidau a lua de mel tardia do governo com o eleitorado independente”, afirmou Felipe Nunes, diretor da Quaest, em entrevista na GloboNews na quarta-feira. Para o diretor do instituto de análise e pesquisa, o prejuízo aconteceu principalmente no eleitorado que se diz independente, ou seja, não se considera nem de esquerda e nem de direita.
Segundo o levantamento, em outubro havia empate técnico entre aprovação e desaprovação de Lula no eleitorado independente de 46% e 48%, respectivamente. Agora em novembro, a desaprovação saiu da margem do empate técnico e chegou a 52%, quase dez pontos maiores que a aprovação de 43% no eleitorado independente, algo que não acontecia desde agosto. A margem de erro da pesquisa é de quatro pontos percentuais nesse segmento.
O cientista político Samuel Oliveira concorda com a avaliação da Quest. “O eleitor independente passa a desconfiar de quem parece pouco disposto a lidar com o crime forte”, avalia ele. “Se Lula quer 2026, precisa fortalecer o discurso de ordem, de Estado presente, de manutenção de normas, e não apenas ampliar os direitos sociais.”
Pará Oliveira, a esquerda esqueceu que o eleitorado não está mais disposto a adiar o debate sobre segurança no país. “Em 2026, aquele que se posicionar como quem resolve, e não apenas quem promete, trará vantagem. A esquerda terá que mostrar o que entende isso ou assistirá à migração dos candidatos cansados para outras alternativas”, afirma o científico político.
Para Paulo Serra (PSDB), ex-prefeito de Santo André e especialista em políticas públicas, como falas do presidente Lula ignoraram a sensibilidade da maior parte da sociedade sobre o tema, e o dano na popularidade é uma consequência natural. “A discussão de mérito da segurança pública é muito mais complexa e não pode se limitar ao sucesso ou insucesso de uma operação, assim como à pertinência ou não de uma fala de algum governante, mas certamente é necessária mais sensibilidade e seriedade na hora de abordar essa questão”, diz Serra.

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