O novo ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Guilherme Boulos (PSOL-SP), admitiu que a esquerda errou na forma como tratou os trabalhadores de aplicativos e prometeu rever a postura do governo com a categoria. A declaração ocorre em meio à frustração do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao estabelecer uma regulamentação, com regras mínimas para a relação entre as plataformas e a categoria.
Desde o início deste terceiro mandato, Lula vem estabelecendo diretrizes mínimas para o trabalho por aplicativo, como o pagamento mínimo de R$ 32,09 por hora trabalhada, além de pagamentos mensais equivalentes a um salário mínimo e contribuição de 7,5% ao INSS. O projeto, no entanto, perdeu apoio após críticas das próprias categorias, que consideram o modelo inviável e distante da realidade de quem vive das plataformas.
“A esquerda errou muitas vezes, e aqui não é o governo, porque sempre colocou o que quer para os trabalhadores dessas novas formas de trabalho. Poucas vezes parou para ouvir o que eles querem”, identificou Boulos em entrevista ao jornal O Globo publicado nesta terça (4).
VEJA TAMBÉM:
-
Boulos classifica a operação no Rio como “demagogia com a vida das pessoas”
Apesar do tom de autocrítica, interlocutores do governo avaliaram que a chegada de Boulos dificilmente mudará o boato da discussão no Congresso. O texto que trata da regulamentação do trabalho por aplicativo já está em fase final na Câmara e, pelo menos, será reaberto.
A negociação é feita pelo ministro Luiz Marinho, do Ministério do Trabalho, e enfrenta resistência tanto das empresas quanto dos motoristas e entregadores. A expectativa é de que Boulos consiga destravar a pauta, mesmo com o ceticismo da categoria.
“Já conversamos com o governo, no Ministério do Trabalho, e as conversas não avançamos. Então, somos gatos escaldados: levamos nossas demandas, mas sabemos perfeitamente que o que pode trazer alguma conquista é a mobilização da categoria”, disse Nicolas Souza Santos, membro da Aliança Nacional dos Entregadores.
No primeiro dia após a posse, Boulos se reuniu com lideranças dos entregadores no Palácio do Planalto e almoçou com representantes da associação poucos dias depois, que entregaram uma carta de reivindicações. O documento pede, entre outros pontos, isenções de impostos para compra de veículos e linhas de crédito com juros reduzidos, semelhantes às oferecidas aos taxistas.
“Entregamos nossas demandas, mas ele ainda não deu retorno prático do que pode ser feito. Ele disse que esta semana teria mais conversas para ver quem ele acionaria para ter o retorno dessas diretrizes”, disse Santos.
Dentro do governo, há quem veja a entrada de Boulos como uma tentativa política de amenizar a resistência de um grupo que hoje é majoritariamente crítico ao Planalto. Mesmo assim, auxiliares virão regularmente para que o tema seja um dos mais espinhosos da gestão atual e que haja necessariamente mudanças substanciais na proposta já em tramitação.
O relator do projeto, deputado Augusto Coutinho (Republicanos-PE), adiantou que a última audiência pública será realizada na próxima terça-feira (11), antes da votação do parecer na comissão especial. Segundo ele, a intenção é levar o texto ao plenário ainda neste ano.
“O Parlamento tem cuidado disso. Estou trocando figurinhas com o ministro Marinho toda hora; ele tem acompanhado toda a discussão. Muitas ideias vieram do projeto que o governo mandou. Não entendi qual é essa missão do Boulos no governo e o que vai mudar”, disse o relator, em tom de ceticismo.
A categoria de motoristas e entregadores cresceu 25,4% desde 2022, chegando a 1,7 milhão de profissionais em 2024, segundo o IBGE. Mais da metade atua no transporte de passageiros por aplicativos como de transporte, enquanto quase um terço trabalha em entregas de alimentos e produtos (29,3%).

Deixe o Seu Comentário