Ganhar a maioria do Senado Federal em 2026 virou o mote pelo qual o grupo mais próximo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), representado pelos filhos, está justificando as escolhas dos candidatos à Casa Alta no Rio de Janeiro, Distrito Federal e Santa Catarina. Nesses estados, considerados importantes para a direita, o núcleo duro do Partido Liberal entende que os interesses locais não devem se sobrepor aos nacionais.
A agenda prioritária para o grupo é aprovar o impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), dar andamento às propostas que limitam os poderes dos magistrados e abrir uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar eventuais abusos do Poder Judiciário.
Tudo isso, na visão do PL, só seria possível se a direita formasse uma maioria numerosa o suficiente no Senado para eleger o próximo presidente da Casa, que concentra o poder de deflagrar iniciativas do tipo.
No âmbito local, no entanto, prevalece o entendimento de que o partido tem mais a ganhar fazendo acordos com o Centrão, abandonando assim a ideia de ter duas candidaturas de direita “puro-sangue” nos estados. A estratégia de montar coalizões com o centro busca garantir que a direita possa eleger o maior número de parlamentares, não só no Senado, mas também na Câmara dos Deputados e nas Assembleias Legislativas.
A situação do Distrito Federal segue esse esclarecimento. O PL irá apoiar o governador Ibaneis Rocha (MDB) para uma vaga ao Senado e terá um candidato apoiado por Bolsonaro. A sigla também irá apoiar a vice-governadora Celina Leão (PP) para o comando da capital federal.
O dilema da sigla para a segunda vaga surge com a indefinição entre os nomes da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro e da deputada federal Bia Kicis (PL-DF). O parlamentar já veio sendo cotado como possível candidato em uma chapa reforçada pelo MDB e lançou, nesta quarta-feira (11), sua candidatura à Casa Alta em um evento com Michelle, Valdemar e outros aliados políticos. Por outro lado, existe a expectativa de que a esposa de Bolsonaro ocupe o lugar da parlamentar caso não integre uma chapa presidencial.
PL-RJ prioritário Castro e Portinho pode disputar por outro partido
O PL do Rio de Janeiro, estado de origem da família Bolsonaro, fechou questão em lançar o governador Cláudio Castro para ocupar o lugar de Carlos Portinho, que é do partido. O parlamentar, no entanto, já demonstrou descontentamento com a decisão e ameaçou mudar de partido para disputar a reeleição.
Sob reserva, uma fonte do PL-RJ argumentou que, apesar de Portinho ser um parlamentar alinhado com a causa conservadora, Castro tornou-se o nome natural para a disputa ao Senado nas últimas semanas. Com a megaoperação da polícia nos complexos do Alemão e da Penha, o chefe do Executivo estadual viu sua aprovação crescer entre os fluminenses, o que animou as lideranças locais.
A mesma fonte também avalia que Carlos Portinho, mesmo sem a operação, não poderia pleitear a vaga devido a uma orientação de Bolsonaro. O ex-presidente teria dito aos correligionários que, nos estados aliados, ele escolheria um nome e o governador do estado escolheria outro. Nessas condições, Bolsonaro indicaria Flávio Bolsonaro para a reeleição, e Castro teria autonomia para lançar seu próprio nome.
No caso de Santa Catarina, o entendimento do grupo mais próximo de Bolsonaro é de que a candidatura do vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ), o filho 02, seria mais importante para os planos nacionais da sigla, o que justificaria a retirada da deputada Carol De Toni (PL-SC) no pleito à Casa Alta.
Apesar de Carlos já ter sinalizado apoio ao parlamentar, um dirigente do PL afirmou que a prioridade para a direita seria manter o acordo feito entre Valdemar Costa Neto, presidente do PL, e o senador Ciro Nogueira, presidente do PP. Ambos acordaram em lançar Carlos, pela cota de Bolsonaro, ao lado do senador Esperidião Amin (PP-SC), que teria o apoio do governador Jorginho Mello (PL).
Composição de chapas a partir da cúpula partidária é comum
Para o cientista político Alexandre Bandeira, o movimento de Jair Bolsonaro de interferir nas composições eleitorais estaduais não é algo inédito nem exclusivo do ex-presidente. Ele lembra que o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem atuado de forma semelhante, ao “impor” aliados em diretórios regionais do PT.
“No DF, Lula fez uma intervenção ‘branca’ no diretório distrital, suspendendo as prévias para a escolha dos candidatos em 2026 e impondo Leandro Grass, amigo pessoal do casal Lula e Janja, como candidato ao governo”, explica o analista. “Isso está deixando os petistas ilustres da capital em pânico, até porque Leandro não é um petista histórico.”
O cientista político aponta ainda que os acordos regionais do PL, como os que envolvem Ibaneis Rocha no DF e Esperidião Amin em Santa Catarina, podem ter efeitos imprevisíveis sobre as promessas de campanha.
“Há o compromisso da troca de apoio pelo voto nessas pautas, mas eleição é eleição e mandato é mandato. A própria família Bolsonaro pode estar fracionando o voto para o Senado, o que colocaria em risco a eleição de duas cadeiras nesses estados”, avalia.
O posicionamento da cúpula do PL sobre o caso de Santa Catarina foi reforçado pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). Em vídeo para as redes sociais, na sexta-feira (7), o congressista cobrou fidelidade dos aliados catarinenses, em especial à deputada estadual Ana Campagnolo (PL-SC), que vem defendendo a candidatura de Carol ao Senado e criticando a escolha do partido de Carlos Bolsonaro.
“O Bolsonaro construiu um exército da direita lutando pelas bandeiras que nós devemos. Se a gente faz parte de um mesmo exército e não segue o que o comandante decide, a gente está fadado à derrota. A partir do momento em que o comandante tomou a decisão, não é inteligente ficar questionando”, disse Flávio.
“A deputada Ana é uma menina brilhante, inteligente e qualificada. Você, Ana, é uma guerreira do nosso exército. Mas, a partir do momento que nosso líder toma uma decisão, isso enfraquece nosso líder e beneficia nosso inimigo”, completou.
Dissidentes podem virar dor de cabeça para candidaturas do PL ao Senado
Se por um lado o PL trabalha para enfrentar a esquerda pelas vagas ao Senado, por outro, candidatos de direita de outros partidos ameaçam iniciar negociações com o Centrão ou lançar candidaturas independentes da legenda comandada por Valdemar.
Recebendo um convite para disputar pelo Partido Novo, a candidatura avulsa de Carol De Toni é avaliada como um perigo para os acordos entre PL e PP, já que a parlamentar foi campeã de votos no estado. Além disso, o sentimento de pertencimento do eleitorado catarinense é um fator que joga a favor da deputada.
No caso de Portinho, o senador fluminense é avaliado como um candidato que não poderá fazer frente ao governador, mas sua eventual candidatura por outro partido pode dividir os votos de Castro.
Apesar de a situação no Distrito Federal estar pacificada, a candidatura do ex-desembargador Sebastião Coelho, pelo Novo, é apontada como um risco para as negociações entre PL e MDB, já que o ex-magistrado dialoga com o público conservador na região de forma mais incisiva que Ibaneis.
O temor por parte da oposição é que uma eventual divisão de votos possa dar espaço para que a deputada Erika Kokay (PT-DF) ganhe projeção na disputa.
O favoritismo de candidatos direitistas de fora do PL também é um risco para o partido de Bolsonaro. Uma pesquisa publicada pela Neokemp Pesquisas, na quinta-feira (6), mostrou que a corrida pelas duas cadeiras ao Senado no Paraná é liderada por Deltan Dallagnol (Novo) e Cristina Graeml (União).
O ex-procurador da Operação Lava Jato desponta com 24,3%, enquanto um ex-candidato à prefeitura de Curitiba pontua 15,6%. O deputado Filipe Barros (PL), o mais próximo da família Bolsonaro, apontou 6% das intenções de votos, em quinto lugar no levantamento.
Direita vive “boa crise” por excesso de nomes competitivos
Para o cientista político Adriano Cerqueira, professor do Ibmec de Belo Horizonte, a disputa dentro da direita brasileira reflete um cenário de força eleitoral, e não de crise. Segundo ele, o campo conservador concentra hoje a maioria do eleitorado, o que atrai mais candidatos e amplia as disputas internas.
“Como o eleitorado brasileiro é majoritariamente mais à direita, é uma questão de mercado. Tem mais votos desse lado. Então há mais candidatos querendo explorar esse potencial”, afirmou Cerqueira.
O professor observa que, ao contrário da esquerda, que tem no PT um partido orgânico e estruturado, a direita é mais fragmentada e pragmática.
“A esquerda é mais preocupada em construir um partido forte, como é o PT, que é um partido de massa. A direita não tem um equivalente. O PL tenta ocupar esse papel, mas enfrentar dificuldades por questões de filosofia política e estratégia. É um campo mais plural e competitivo”, explicou.
Cerqueira também avalia que o bolsonarismo não é um partido, mas um movimento personalista, cuja sobrevivência depende da figura de Jair Bolsonaro.
“O bolsonarismo é uma agremiação em torno do carisma de Bolsonaro. O grande desafio dos filhos é conseguir sobreviver politicamente sem ele. Se o ex-presidente deixar a política — por exemplo, se for preso —, fica a dúvida sobre quem herdará esse capital político”, apontou.
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