Nesta quarta-feira, familiares de 102 vítimas da ditadura militar receberam atestados de óbito retificados em cerimônia na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
A entrega dos registros corrigidos foi feita pelo ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Macaé Evaristo, que falou sobre a centralidade deste momento para a permanência da memória de todos que lutaram pela democracia.
O que fazemos aqui hoje é uma garantia de um direito que ele veio tarde, mas que só veio com luta de sobreviventes e familiares de vítimas da ditadura no país. É lembrar que dias como os que se iniciaram entre 31 de março e 1 de abril de 1964 nunca mais podem se repetir.
Para os familiares das vítimas da ditadura militar, a entrega das certidões de óbito retificadas marca o reconhecimento de que o Estado brasileiro cometeu graves graves de direitos humanos no período do regime militar.
Maria Marighella, neta de Carlos Marighella, política e poeta assassinada por agentes do Dops em 1969, falou sobre o significado da entrega da certidão de óbito do avô.
Eu acho que não vou receber nenhum papel, eu vou receber uma prova inconteste de que o Estado brasileiro foi responsável pela morte de Marighella, pela execução de Marighella e, portanto, nesse ato de reconhecimento, o Estado brasileiro, ato contínuo assumir a responsabilidade sobre a restituição. Quando o Estado brasileiro executa Marighella, o Estado brasileiro atrasa o sonho de justiça e de liberdade.
Marcelo Rubens Paiva, filho do ex-deputado federal Rubens Paiva, morto pela ditadura em 1971, e que teve a história retratada no filme “Ainda estou aqui”, comentou a busca dos familiares por reconhecimento.
A gente está em busca de consideração, consideração a prisão, reconhecida porque foi presa, consideração a culpa do Estado, consideração o desaparecimento e um pouco essa luta foi ganhar corpo. Demorou no Brasil a democracia, ela demorou para ser reinstalada, demorou para o governo federal assumir a culpa e agora demorou para ter o atestado de óbito com os fatos do que realmente aconteceram.
Pedro Estevão Pomar, neto de Pedro Pomar, fundador do Partido Comunista do Brasil, assassinado na chacina da Lapa, em São Paulo, em 1976, destacou que o momento é importante por trazer o tema público para o debate, mas reforça que ainda é preciso acabar com a impunidade.
Nós, familiares, queremos proteção dos assassinos que foram agentes do serviço da ditadura militar. Nós queremos abertura dos arquivos. Nós queremos a localização dos desaparecidos. Tudo aquilo que a Comissão Nacional da Verdade incluiu no seu relatório final. Então é preciso desengavetar o relatório final, que já foi apresentado há quase 11 anos. Em dezembro de 2014 eu estava lá e é preciso então cumprir aquelas medidas que estão lá.
As certidões de óbito foram corrigidas com a causa de morte registrada como não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro no contexto da perseguição sistemática à população identificada como política dissidente do regime ditatorial instaurado em 1964. Esse reconhecimento representa mais um passo na produção da memória coletiva sobre o que aconteceu na história do Brasil.
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