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O homem que empurrou Santa Catarina para o futuro

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Quem acompanhou a história política de Santa Catarina da metade do século passado hoje costuma cravar que até Celso Ramos foi o melhor governador que o Estado teve no período. Sua gestão, entre 1961 e 1966, deixou rastros em todos os setores, mas foi excepcional na área da educação, na criação de infraestrutura de estradas e energia elétrica e no planejamento de ações e projetos que ajudaram a consolidar o bem sucedido modelo de desenvolvimento catarinense.

Este dia 18 de dezembro marca os 125 anos de nascimento do ex-governador, membro de uma tradicional família de políticos que teve entre seus membros até um presidente da República – seu irmão Nereu Ramos.

Ex-governador Celso Ramos (d) foi pecuarista e era empresário – Foto: Reprodução/ND

Celso Ramos (1897-1996) foi pecuarista e era empresário quando entrou na política por causa de uma trágica contingência: Nereu, então senador, estava entre as vítimas de um acidente aéreo que matou também o governador Jorge Lacerda e o deputado federal Leoberto Leal, em 18 de junho de 1958, perto de Curitiba.

Na ferrenha disputa entre PSD (Partido Social Democrático), ao qual permanecer o clã Ramos, e UDN (União Democrática Nacional) em Santa Catarina, era preciso fazer frente às hostes udenistas, que haviam vencido em 1956 com Lacerda e encerravam o mandato com Heriberto Hülse, o vice que assume após o sinistro no Paraná.

Vitorioso no pleito de outubro de 1960, Celso Ramos montou uma equipe de jovens e competentes secretários e assessores, entre os quais se destacaram o advogado e economista Alcides Abreu, o engenheiro Annes Gualberto, o empresário Fernando Marcondes de Mattos e o engenheiro agrônomo Glauco Olinger. Esse grupo criou o Plameg (Plano de Metas do Governo do Estado), elaborado a partir de consultas feitas em todo o Estado com base nas respectivas necessidades e carências – que não eram carentes, dado o isolamento da maioria das regiões, a falta de rodovias e as deficiências de infraestrutura que prejudicavam o escoamento da produção agrícola e industrial, então já substancial em Santa Catarina.

“Ela era um visionário, com foco sempre no futuro”, diz um de seus netos, o diretor superintendente do Sebrae/SC, Carlos Henrique Ramos Fonseca. “Foi o melhor govenador do passado”, afirma o jornalista Paulo da Costa Ramos, que foi assessor de Celso Ramos em parte de sua gestão do século. É desse período a criação do Besc (Banco do Estado de Santa Catarina) e da Udesc (Universidade do Estado de Santa Catarina).

Superintendente do Sebrae/SC, Carlos Henrique Ramos Fonseca, é neto de Celso Ramos – Foto: Divulgação/ND

O mesmo quinquênio também assistiu à criação da Celesc (Centrais Elétricas de Santa Catarina), que implantou PCHs (pequenas centrais hidrelétricas) que acabaram com a falta de luz em dezenas de municípios. Um exemplo da precariedade na área da energia é dado por neto Carlos Henrique Fonseca: “Em Brusque, quando a fábrica da Renaux estava funcionando, a população ficava às escuras, sem luz elétrica”.

Um panorama dos potenciais e carências do Estado

O Plano de Metas do Governo fez a diferença nos cinco anos de mandato de Celso Ramos, mas nasceu antes, no começo da década de 1950, quando foi criada a Fiesc (Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina). A entidade unificou os sindicatos patronais e identificou as necessidades da indústria em cada região, em especial no campo da infraestrutura.

O futuro governador presidiu a Fiesc durante dez anos e foi nesse período, viajando pelo Estado e colando a federação à CNI (Confederação Nacional da Indústria), que consolidou sua liderança num segmento que passou a ter influência crescente junto às instâncias de poder.

Esse movimento, que também implantou em Santa Catarina os departamentos regionais do Sesi (Serviço Social da Indústria) e do Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial), surgiu, em 1960, no Seminário Socioeconômico da Fiesc, cujas propostas surgiram a compor o Plameg. Daí surgiu o primeiro orçamento plurianual de um governo estadual no Brasil. Além do Besc, da Udesc e da Celesc, também nasceu este documento a Erusc (Empresa de Eletrificação Rural de Santa Catarina), essencial para fortalecer o modelo agroindustrial catarinense. E, para acabar com o isolamento de uma região inteira, Celso Ramos criou a Secretaria dos Negócios do Oeste, com sede em Chapecó.

Foi um período de multiplicação de escolas (2.500 novas salas de aula), crescimento da indústria e expansão da malha rodoviária – as primeiras ligações asfálticas entre a Serra e o Planalto Norte com os portos de Itajaí e São Francisco do Sul, por exemplo. Em 2023, a Fiesc vai criar um memorial e montar uma exposição itinerante sobre a figura de Celso Ramos como empresário e político que ajudou a mudar os rumores de Santa Catarina.

Casal Celso e Edith com os filhos e netos nas bodas de prata – Foto: Reprodução/ND

Dos campos de Lages para a elite da política estadual

Celso Ramos administrava suas empresas em Florianópolis (Companhia Florestal de Santa Catarina e C. Ramos SA, empregada na área automotiva) e estava na presidência da Fiesc quando perdeu o irmão Nereu, então senador, no citado acidente aéreo perto de Curitiba. O Estado era comandado pela UDN, dominado havia décadas pelas famílias Konder e Bornhausen. Irineu Bornhausen foi governador entre 1951 e 1956, sucedendo a Aderbal Ramos da Silva (sobrinho de Celso), e fazendo de Jorge Lacerda seu sucessor. Era preciso romper o ciclo, e Celso largou as lides de empresário para concorrer ao Palácio do Governo.

Com o prestígio que lhe conferiu a carga na Fiesc, ele derrotou Irineu, então deputado federal. Retomava assim o protagonismo político da família, iniciado por Vidal Ramos, que governou Santa Catarina de 1910 a 1914 e que viu o filho Nereu à frente do Executivo estadual entre 1935 e 1945, inicialmente eleito pelo voto popular e depois como interventor federal, nomeado por Getúlio Vargas durante o Estado Novo.

A família era da região da Coxilha Rica, no interior de Lages, onde se fixou depois de emigrar da ilha Terceira, nos Açores, na segunda metade do século 18, depois de um período vivido na vila de São Miguel (atual Biguaçu). A conexão com a capital Florianópolis havia sido aberta com a presença do clã em cargos importantes na administração estadual, e em 1938 foi a vez de Celso Ramos trocar os campos do Planalto pelos ares do litoral.

Sétimo dos 14 filhos de Vidal e Thereza Fiuza Ramos, teve como irmãos pelo menos quatro outros nomes relevantes da política – Mauro Ramos, prefeito de Florianópolis; Joaquim Fiuza Ramos, deputado federal; Hugo de Oliveira Ramos, deputado estadual; e Vidal Ramos Júnior, prefeito de Lages.

No livro “Coxilha Rica – Genealogia da Família Ramos”, Celso Ramos Filho, que foi deputado estadual em duas legislaturas, faz um alentado histórico do clã, do patriarca Matheus José Coelho e Maria Antônia de Jesus, nascidos nos Açores, até a sétima geração . Ali, é possível conhecer a trajetória de uma família que tem ramificações em todo o Estado, no Rio Grande do Sul e em outras partes do Brasil.

Domingos de almoço na casa da avó

Neto de Celso Ramos, Carlos Henrique Ramos Fonseca, 57 anos, conviveu muito com o avô porque os filhos e filhas do ex-governador residiam perto dos pais, na região da avenida Trompowsky, em Florianópolis. “A entrada de nossa casa ficava na rua São Jorge, mas a família toda ocupava uma espécie de condomínio, por isso a facilidade de contato”, conta. “Eram 28 netos, todos muito próximos. E minha avó [Edith Gama Ramos] reunia todos nos almoços de domingo, o que permitiu uma relação muito grande entre os primos”, conta.

A mãe de Carlos Henrique, Wilma, 93 anos, viúva de Ângelo Francisco Fonseca, é uma das duas filhas vivas de Celso Ramos – a outra é Maria Helena, 91, casada com César Bastos Gomes. “Quando meu avô morreu, em 1996, a família tinha mais de 100 membros, incluindo netos e bisnetos”, diz ele.

No fim do mandato, Celso ajudou o eleger o correligionário Ivo Silveira ao governo do Estado e se tornou senador da República, cargo que exerceu entre 1967 e 1975. O neto Carlos Henrique Fonseca diz que, após sair da política, Celso voltou para a pecuária , mantendo uma criação de gado leiteiro na Vargem Pequena, na Ilha de Santa Catarina.

Seu nome batiza os municípios catarinenses de Celso Ramos e Governador Celso Ramos, além de uma praça na avenida Beira-mar Norte, em Florianópolis, e vários logradouros e escolas públicas em todo o Estado.

MARCAS DE CELSO RAMOS

  • Criou e presidiu o Sindicato da Indústria de Extração de Madeiras de Santa Catarina
  • Fundou e foi o primeiro presidente (durante 10 anos) da Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina
  • Criou e instalou o Besc (Banco do Estado de Santa Catarina)
  • Participa, com os governadores do Paraná e Rio Grande do Sul, da criação do BRDE (Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul) e do Codesul (Conselho de Desenvolvimento do Extremo Sul)
  • Criou a Erusc (Empresa de Eletrificação Rural de Santa Catarina)
  • Criou o Fundesc (Fundo de Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina)
  • Criou o Ipesc (Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina)
  • Criou a Udesc (Universidade para o Desenvolvimento de Santa Catarina)
  • Criou a Secretaria dos Negócios do Oeste


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