Os deputados estaduais do Rio de Janeiro deverão votar nesta terça-feira (17), em regime de urgência, o Projeto de Lei 4.518/24, que defende a mudança do índice a ser aplicado para os reajustes anuais dos custos processuais no estado. Uma mudança pode aumentar o valor das taxas cobradas para cobrir despesas relacionadas à tramitação dos processos na Justiça fluminense.
O projeto enviado pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) à Alerj propõe uma troca do índice de reajuste. Atualmente, os valores são calculados com base na UFIR-RJ, que tiveram variação de 4,72% em 2024.
Se a proposta para aprovação, as taxas passarão a ser reajustadas anualmente tendo como base a Selic, taxa básica da economia brasileira, que está em 12,25% atualmente.
A mudança vai representar mais um aumento nos custos processuais para a população do Rio de Janeiro. Em maio, o g1 noticiou que o Estado teve o segundo maior aumento do país nas despesas com processos judiciais.
A presidente eleita da OAB-RJ, Ana Tereza Basilio, criticou a proposta e pediu que os deputados não aprovassem a mudança. Para advogada, o motivo da votação nessa época do ano é uma estratégia para evitar debates sobre o tema.
“Essas propostas de aumento sempre vêm no apagamento das luzes e isso é muito deletério em uma democracia. O correto seria submetido à sociedade antes de mandar o projeto pata à Alerj”.
“Essa mudança afeta a população, a advocacia e até o investimento no estado. Para o investidor é mais barato estar em Minas e em São Paulo do que no Rio. Isso não contribui para o Estado”, criticou Ana Tereza.
De acordo com o estudo do CNJ Diagnóstico das Custas Processuais Praticadas nos Tribunais, o Rio pratica as custas iniciais mais caras do país, no valor de R$ 795,43.
O estado registrado também o maior aumento em 5 anos, com uma variação de 857%. Em 2019, os custos mínimos estavam em R$ 83,29. Na ocasião, o valor representava o 6º mais baixo do país.
Conselho Nacional de Justiça (CNJ) — Foto: Divulgação/CNJ
Segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o valor cobrado no Rio é 150 vezes maior do que a taxa cobrada pela Justiça Federal, que cobra R$ 5,32. Já o Supremo Tribunal Federal (STF), cobra R$ 450,08. O valor é 44% menor que a taxa cobrada pelo TJRJ.
A taxa cobrada no Rio é o dobro do valor praticado em Minas Gerais e no Espírito Santo, além de ser três vezes maior que a taxa cobrada em São Paulo.
Mudança na contramão do RJ
Apesar de ser uma proposta apresentada pelo Poder Judiciário, o projeto só poderá ser votado na Alerj se tiver chancela do Poder Executivo ou do Poder Legislativo.
Portanto, como a votação desta terça-feira será a segunda discussão do projeto – e por isso pode ser definitiva – existe o entendimento de que a proposta tenha o apoio do Governo do Estado ou da presidência da Assembleia Legislativa.
Por conta disso, a proposta que pede a taxa Selic como índice a ser aplicado para os reajustes anuais das taxas processuais é vista como contraditória por quem é contra o projeto.
A justificativa para esses analistas é justamente um pedido do Governo do RJ, com apoio da Alerj, para que a União deixe de usar a taxa Selic como indexador da dívida do Rio de Janeiro com o Governo Federal.
Ao longo do ano de 2023, o governador Cláudio Castro foi algumas vezes a Brasília para negociar uma nova fórmula para a cobrança da dívida estadual com a União.
“É contraditório. Está no Congresso Nacional uma postulação do Estado do Rio de Janeiro, com apoio da Alerj, que a dívida não seja mais corrigida pelo IPCA + 4% porque é considerada excessiva para o Estado. E o que o Estado e o Tribunal estão A obrigação é ainda maior. Se eles compartilham esse índice alto, porque vão passar esse mesmo indicador para o tributário”, questionou o presidente eleito da OAB-RJ.
Deputados da Alerj deliberam sobre o Orçamento do estado para 2025 — Foto: Thiago Lontra/Divulgação
A deputada Martha Rocha (PDT), que apresentou emendas ao projeto original, também mencionou a contradição do pedido apresentado pelo TJRJ.
“Se a gente argumenta isso para a dívida com a União, como vamos adotar a mesma prática para o cidadão fluminense. Eu não tenho dúvidas de que a prestação jurisdicional tem uma taxa muito mais cara que a utilizada em outros estados e ainda vamos colocar um aumento , tomando como base a taxa Selic? Eu não posso votar a favor disso porque acho que vai ser prejudicial”, comentou Martha Rocha.
TJRJ aponta dificuldade financeira
Segundo o texto de justificativa do projeto assinado pelo presidente do TJRJ, o desembargador Ricardo Rodrigues Cardozo, a troca do índice de reajuste é necessária. De acordo com ele, o tribunal terá dificuldades financeiras nos próximos anos, caso não troque a UFIR-RJ pela Selic.
“A medida se faz necessária na medida em que os estudos financeiros realizados pelos órgãos técnicos do Poder Judiciário apontam para a projeção de déficits de arrecadação nos anos vindouros se mantidos a UFIR-RJ como fator de atualização”, escreveu o desembargador.
Para a deputada Martha Rocha, os problemas orçamentários do TJRJ não devem ser repassados à população do estado.
“Eu respeito os argumentos do TJ, mas eu acho que meu olhar tem que ser na defesa daquele que recebe a prestação do serviço da Justiça. Eu não posso transferir o ônus de um problema de orçamento do TJ para quem vai ter que pagar um imposto maior”.
“Não é apenas transferir esse ônus para o povo fluminense. Se existe esse problema, tem que fazer como tudo faz: cortar custos e fazer os ajustes necessários. Não pode transferir para a população”, completou o parlamentar.
Em nota, o Tribunal de Justiça disse que o objetivo da alteração é a padronização do índice de reajuste das taxas do sistema judicial fluminense com as práticas nacionais.
Leia a nota do TJRJ na integra:
“Considerando que tanto o Supremo Tribunal Federal como a Justiça Federal do País utilizam, para fins de reajuste de suas tabelas de custos, índice diverso do Tribunal de Justiça, estamos propondo sua adoção como padrão no Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro, tendo a alteração especificamente uniformizadora, em nada prejudicando o acesso à Justiça daqueles que dela necessitam.
Importante destacar, no entanto, que o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) desempenha um papel fundamental na garantia do acesso à justiça, promovendo medidas como a gratuidade de justiça para cidadãos economicamente vulneráveis. Esta isenção, disposição em legislação, abrange desde taxas judiciais até despesas com serviços essenciais ao processo judicial, garantindo o direito de ação e defesa a todos os cidadãos, independentemente da sua condição financeira.
O contexto dos custos judiciais do TJRJ requer uma análise detalhada, considerando o número significativo de processos com gratuidade de justiça – no percentual de 1/3 (um terço) de todas as ações em curso na Justiça deste Estado – e o custo para manutenção e funcionamento do Poder Judiciário fluminense. Logo, nenhuma alteração que se realize alterará a garantia de amplo acesso à Justiça daqueles que dela precisam.
A manutenção dessa balança entre eficiência operacional e justiça social é um desafio contínuo que o Tribunal busca melhorias para melhor atender às necessidades da população. Por fim, cabe registrar que, de acordo com o relatório “Diagnóstico das Custas Processuais Praticadas nos Tribunais”, produzido pelo CNJ, entre os tribunais das 27 unidades federativas, o TJRJ ocupou a posição de cobrar o sexto menor valor em custos iniciais e taxas judiciais mínimos”.
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