
A turma de Guilherme Boulos (PSOL-SP) como chefe da Secretaria-Geral da Presidência representa, para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a oportunidade de manter um forte cabo eleitoral da esquerda dentro do governo.
Caberá a Boulos liderado, com aparelho estatal e recursos federais, aquilo que já se vê na propaganda oficial e em eventos públicos como possível campanha antecipada pela reeleição do presidente, agora levada para o cotidiano das ruas e da mobilização popular.
A nomeação de Boulos, anunciada em 20 de outubro, revela mais do que uma simples mudança do Legislativo para o Executivo. Segundo os analistas, trata-se de uma ação estratégica do projeto eleitoral de Lula, além da preparação do futuro na carreira do deputado, tido como potenciais herdeiros políticos do petista.
“Boulos foi o escolhido para ser o novo Lula. O que ele vai fazer no novo cargo é o que antes se chamava campanha eleitoral antecipada, travestida agora de divulgação das ações de governo, percorrendo o país do norte a sul”, afirma Madeleine Lacsko, consultora de comunicação.
Escolha de Boulos mirou articulação política com movimentos sociais
O cargo palaciano que Boulos assume tem papel central de articulação política, ligação com movimentos sociais e presença em comunidades de todos os estados. Ele próprio afirmou que a sua missão será de “ajudar a colocar o governo na rua”.
A notícia da troca de Márcio Macêdo (PT) por Boulos no cargo de secretário-geral evocou o histórico de polêmicas do ativista.
A indicação provocou reações tanto intensas de apoiadores quanto da oposição. Do lado governista, a avaliação interna é que a escolha de Boulos corrige o distanciamento entre o movimento social e o Palácio do Planalto, com um novo interlocutor menos burocrático e mais engajado. Além disso, ela serviu de política de reabilitação após sua derrota na disputa pela Prefeitura de São Paulo em 2024, com apoio de Lula.
Para analistas, a nomeação faz parte de uma operação maior: levar Boulos ao núcleo do poder federal, ao mesmo tempo em que a tira da disputa pelo governo estadual — o que estimularia a frente nacional de Lula e preservaria o espaço reservado ao PT em São Paulo. Mas Boulos afirmou que Lula não o proibiu de disputar as eleições em 2026, deixando uma decisão para o próximo ano, embora haja chance de ele ficar até o fim. Uma das possibilidades seria Boulos candidatar-se ao Senado.
Como “ministro da mobilização” ou “ministro da reeleição”, Boulos mira as chamadas bases sociais para recuperar a capilaridade em regiões onde o Estado parece ausente, dando visibilidade à gestão federal e disponibilizando palanques e apoios políticos para 2026.
Oposição acusa Lula de aparelhar a máquina estatal para seus fins eleitorais
O anúncio de Boulos no Ministério foi recebido com protestos na oposição. Parlamentares de direita classificaram a nomeação de captura ideológica do Estado. Para eles, Boulos, que tem origem na militância dos movimentos sem-teto, é incompatível com a função ministerial.
O deputado Kim Kataguiri (União-SP) ironizou a escolha de Boulos pelo presidente, que já era ventilada desde o começo do ano: “Lula nos deu dois presentes: colocar mais uma pessoa para atrapalhar o governo e tirar as eleições um dos piores candidatos de São Paulo”.
Já o deputado Ricardo Salles (Novo-SP), ex-ministro de Jair Bolsonaro (PL), criticou o “prêmio da militância”: “agora, invasão é pela porta da frente, com tapete vermelho e carro oficial”, escreveu nas redes sociais. Outros acham que o ativismo evitará eleições moderadas e elevará a polarização.
Os parlamentares da direita classificaram a nomeação de Boulos como “deboche” e “vergonha nacional”. “Enquanto esfola o povo com a maior carga tributária da história, o revolucionário de iPhone é premiado com carga para seguir destruindo o país”, disse o vice-líder da oposição na Câmara, Ubiratan Sanderson (PL-RS).
Uma das metas de Boulos é aproximar-se de Lula de trabalhadores por aplicativo
Leandro Gabiati, diretor de consultoria política Dominium, reforça que uma das tarefas de Boulos envolve motoristas e entregadores de aplicativos, um público a ser conquistado pelo PT. “Lula sabe que é preciso aprimorar o diálogo com setores com os quais seu partido tradicional não se comunica, como são as categorias de trabalhadores vinculados a novas tecnologias e os pequenos empreendedores”, explica.
Um dos fatores que poderiam ajudar Boulos nessa missão é o fato de ele ser conhecido em São Paulo, onde há grande quantidade de motoristas. Por outro lado, não fica claro se a pauta dele de defender os direitos desses trabalhadores terá aderência entre motoristas de aplicativo, que são mais desenvolvidos à desregulamentação do setor.
O especialista vê a classe C como decisiva numa disputa preliminarmente polarizada, que deverá resultar numa diferença menor de votos ao vencedor. “Políticas de reforço da Minha Casa, Minha Vida, ampliação da autorizada do Imposto de Renda e a aproximação aos trabalhadores de aplicativos passam por aí”, observa, frisando que o governo vai buscar retorno eleitoral a partir dessas iniciativas.
Segundo analistas, por essas razões, a indicação de Boulos tem significado muito além da mera composição de forças do governo. Trata-se de dar a ele a função de mobilizar os movimentos sociais para o pleito de 2026. Nesse sentido, o deputado teria até se comprometido a não disputar novo mandato para evitar prejuízo à função, condicionado a novas avaliações. Para ser candidato, ele teria de se desincompatibilizar até abril.
A chegada de Boulos à Esplanada dos Ministérios não apenas reforça o caráter eleitoreiro do governo, mas, destacam analistas, também lança o alerta sobre riscos à democracia. Isso porque se a mobilização vira uma especificamente em si mesma e o Estado se transforma em instrumento de campanha, deixando seu papel constitucional em segundo plano.











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