
Quando decidiu se isolar para compor e gravar sozinho um de seus discos menos comerciais, no começo dos anos 1980, Bruce Springsteen não estava lá muito preocupado se seus fãs gostassem ou não. Esse é mais ou menos o mesmo clima que “Springsteen: Salve-me do desconhecido” – nova cinebiografia na praça, que estreia nesta quinta-feira (30) nos cinemas brasileiros – passa ao contar a história por trás da gravação de “Nebraska”. Apoiado na atuação competente de Jeremy Allen White (“The Bear”), o diretor Scott Cooper (“Coração louco”) construiu um retrato sombrio e compassado da depressão de um ídolo no auge de sua fama. Dá para entender aqueles que não se apaixonam. O período está longe de ser dos mais empolgantes. Há muita dor e angústia e rebeldia de gênio – e bem pouco do rock operário agitado realizado pela maior parte da obra do “Boss” (como o americano é conhecido). ‘Springsteen: Salve-me do Desconhecido’ ganha primeiro trailer; assist A escolha ajuda a evitar a estrutura mais padrão do gênero. “Salve-me do desconhecido” não padece do começo na infância sofrida, seguida da humilhação musical emendada pela revelação, e as subsequentes fama, drogas, mulheres e reinvenção. Infelizmente, o foco em um período silencioso – ou menos barulhento – e quase que particular demais ressalta também o uso (moderado, é verdade) desconexo dos clichês de um cinebio padrão. Do ‘Bear’ ao ‘Boss’ “Salve-me do desconhecido” começa pelo fim da turnê de “The River”, até então o disco mais bem acontecido de um jovem Springsteen. No momento em que faria sentido manter a inércia com um novo álbum de sucessos, o cantor decidiu voltar para a casa alugada longe da cidade, grava um novo projeto sozinho em seu quarto e teima pelo resto do filme para que as músicas – que exorcizam a relação complicada com o pai – sejam lançadas sem divulgação, sem shows e até mesmo sem sequer uma foto na sua capa. Testado e aprovado em “The Bear”, White repete sua atuação como gênio reprimido, mas consegue elevar o nível de carisma uns bons e necessários para o Boss. Jeremy Allen White em cena de ‘Springsteen: Salve-me do desconhecido’ Divulgação A falta de semelhança física no fim até favorecer a atuação, já que não há maquiagem e próteses para distrair o público ou servir de muletas. No começo, não deixa de ser esquisito assistir ao chef obcecado da série com um sotaque meio solicitado e uma guitarra na mão, mas a estranheza é superada com o tempo. Em especial, conforme a história avançada para a explicação das fixações do astro – uma incontornável e depressão. Por seu lado, Jeremy Strong (“Succession”) se sacramenta como um dos maiores coadjuvantes de apoio de Hollywood após a atuação em “O Aprendiz” (2024), que rendeu sua primeira indicação ao Oscar. Dessa vez, no entanto, com uma atuação diametralmente oposta, como o doce e empático empresário e produtor Jon Landau (suas chances com a Academia só não são maiores por causa de uma participação menor no filme e uma categoria já dominada por Sean Penn de “Uma batalha após a outra”). Salve-nos dos clichês Mesmo com as montagens quase obrigatórias de composições sem grandes explicações e a decisão incompreensível de relevante as gravações com a E Street Band, enviadas pelo cantor em “Nebraska”, “Salve-me do desconhecido” lida bem com as chavões do gênero. A direção só perde a mão com os flashbacks em preto e branco da infância de Springsteen. Como tudo contado no roteiro baseado no livro “Deliver me fromwhere”, de Warren Zanes, fica claro que a relação com o pai é importante para o ídolo e sua formação. Jeremy Strong e Jeremy Allen White em cena de ‘Springsteen: Salve-me do desconhecido’ Divulgação No filme, no entanto, as cenas parecem retalhadas fora de lugar, com tom exagerado e momentos provocados – quase como se não fizessem parte do todo. Para o lançamento de “Nebraska”, Springsteen bateu o pé e não deixou sua visão artística comprometida de forma alguma. “Salve-me do desconhecido” talvez pudesse ter se beneficiado um pouco da mesma teimosia. De qualquer forma, sirva como uma boa introdução para um gênio de 76 anos que talvez não seja mais tão conhecido pelos jovens como já foi um dia. É provável que um público formado por pessoas que não sejam fãs aprecie mais o filme, sem tantas expectativas de ver episódios mais marcantes da vida do cantor. Ao contrário de muitos cinebios por aí, “Salve-me do desconhecido” é mais interessado na viagem do que não tem destino. Pode não ser uma abordagem mais animada, mas não deixa de ser emocionante. Cartela revisão crítica g1 Arte/g1
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