Continuação do sucesso inexplicável de 2019 poderia ser muito boa, mas se contenta em ser apenas ‘menos ruim’. Filme estreia nesta quinta-feira (3) nos cinemas brasileiros. Apesar de suas muitas, muitas falhas, “Coringa: Delírio a dois” ao menos é mais ousado que seu já ruim antecessor, o sucesso inexplicável de 2019. A continuação que estreia nesta quinta-feira (3) nos cinemas brasileiros é uma mistura esquizofrênica de gêneros que nunca se conectaram totalmente: um musical bem executado, mas arrastado, que não sabe se aproveitar do talento e do carisma de Lady Gaga, suposta coprotagonista da história; um filme de prisão/manicômio com bons momentos e ainda mais clichês; e um filme de tribunal, previsível e sem qualquer sentido. Uma aposta mais sincera e focada no primeiro deles poderia elevar “Delírio a dois” a algo muito melhor do que o sofrido “Coringa”. Há vislumbres claros de uma vontade contida – e nunca realizada – de transcender. Assista ao trailer de “Coringa: Delírio a Dois” A continuação, no entanto, não tem coragem de abraçar de vez o inesperado e toda vez que se aproxima demais do limite volta meio de supetão para a segurança do previsível. Uma pena. Ao final de quase duas horas e vinte minutos de duração, a obra dirigida por Todd Phillips (que novamente divide o roteiro com Scott Silver) se contenta em ser apenas não tão ruim quanto a primeira – mas ainda ruim. Ah, tadinho “Delírio a dois” é uma continuação direta – e totalmente desnecessária – do filme anterior. Na trama, o comediante brigado que ficou conhecido como o palhaço assassino Coringa (Joaquin Phoenix) aguarda seu dia no tribunal. Preso em um manicômio para criminosos, ele conhece um fã apaixonado (mais próximo à origem da palavra, “fanática”), que apresenta um pouco de alegria, esperança e música em sua vida tão sofrida. Tais momentos são, de fato, o melhor que o filme tem a oferecer. Infelizmente, o roteiro reserva 99% (aproximadamente) da cantoria a cenas de sonhos ou fantasia. Por mais bem realizados sejam, elas nunca avançaram a história em si, relegadas a intervalos de luxo até a hora de voltar à trama em si. Sem clássicos para “homenagear”, como seu antecessor cometeu com “Taxi Driver” (1976) e “O rei da comédia” (1982), a sequência é genuinamente mais ousada e perigosamente criativa. Só lhe falta coragem. Joaquin Phoenix em cena de 'Coringa: Delírio a dois' Scott Garfield/Warner Bros. Pictures Já o enredo principal reflete o tom do primeiro e sofre do grave distúrbio de se levar a sério demais, com algo de incolor e insosso do começo ao fim . Ok, o protagonista é um comediante fracassado e perturbado, mas o roteiro não precisa seguir o exemplo de forma tão radical. Não chega a ser tão sofrido, dolorido, triste, angustiado e atormentado, com uma trilha sonora de um único violino amargo para pontuar tamanho sofrimento, mas, sem a música, “Delírio a dois” é no máximo anêmico. Uma evolução, é verdade, mas ainda muito aquém do que o Príncipe Palhaço do Crime (como o vilão do Batman é carinhosamente chamado) dos quadrinhos merece. Delírio a 1,5 Um dos maiores atores de sua geração, Phoenix entrega outra atuação muito acima da qualidade do roteiro ao qual fica preso. A primeira rendeu o (exagerado) Oscar em 2020 – a segunda, em um filme com recursos já manjados, talvez não tenha o mesmo tipo. A seu lado, é Gaga quem oferece o verdadeiro sopro de ar fresco. Mesmo ao assumir o papel tão marcante de Arlequina (já realizado nas mãos de Margot Robbie), a cantora apresenta uma versão própria e ao mesmo familiar. Joaquin Phoenix e Lady Gaga em cena de 'Coringa: Delírio a dois' Niko Tavernise/Warner Bros. Pictures Até por isso, é desesperador perceber que um personagem nunca deixa de ser apenas uma força motivada para o protagonista. Relegada ao ponto de vista do palhaço, ela não consegue superar a unidimensionalidade de um fã apaixonado por um furado ideal. O título promete dois, mas o delírio do novo “Coringa” sofre para chegar a um e meio no máximo. O mais triste é que, o tempo todo, o filme flerta com o sucesso. Quando a periga musical fica maluco demais, descontrolado demais, colorido demais, uma mão invisível (chamada Todd Phillips) puxa as rédeas e devolve o espectador aos corredores frios do manicômio ou à trama chata e sem sentido do julgamento. É tanto coito interrompido que, depois de um tempo, novas cantorias causam um acontecimento que mistura trauma com tédio. Assim como o próprio protagonista, o público só quer o doce rompimento do fim – que até vem, mas só depois de mais umas três ou quatro canções. Cartela comentário crítica g1 g1
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