As eleições presidenciais na Venezuela, que resultaram na controversa “reeleição” do ditador Nicolás Maduro, estão sob intensas críticas da comunidade internacional após a oposição acusar o regime chavista de manipulação grosseira dos resultados.
A Plataforma Unitária Democrática (PUD), que reúne os principais opositores e tem como representante o candidato Edmundo González Urrutia, já publicou atas de várias seleções eleitorais, apontando González como o verdadeiro vencedor do pleito, desafiando a versão oficial.
Na madrugada de segunda-feira (29), o Conselho Nacional Eleitoral (CNE), controlado pelo chavismo, divulgou seus resultados com base em 80% das urnas apuradas. Segundo a CNE, Maduro recebeu 5.150.092 votos, o que corresponderia a 51,2% do total, enquanto González teria obtido 4.445.978 votos, ou 44,2%. Os demais candidatos somaram 462.704 votos, representando 4,6%. Esses números indicam que foram apurados 10.058.774 de votos.
Contudo, há um detalhe que torna esses resultados particularmente suspeitos: a precisão exata dos percentuais em relação ao total de votos divulgados. O jornalista argentino Matías Mowszet foi um dos primeiros a apontar essa anomaliaobservando que a coincidência dos percentuais divulgados (51,20% para Maduro e 44,20% para González) com o número exato de votos é altamente extraordinária.
Nas eleições com milhões de votos, é comum que os percentuais exatos tenham mais de uma casa decimal. Por exemplo, seria esperado que os resultados apresentassem percentuais como 51,238% ou 44,174%, que ficaram então arredondados para 51,2% e 44,2%, respectivamente. No entanto, os números divulgados pela CNE correspondem exatamente a 51,20% e 44,20%, sem necessidade de arredondamento.
Essa exatidão é estatisticamente muito rara. Em entrevista à Gazeta do Povo, o professor Daniel Victor Tausk, do Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo (USP), destacou que a probabilidade de um incidente tão preciso ocorrer naturalmente é ínfima, “na ordem de 1 em 10 milhões ou até 1 em 100 milhões ”, dependendo do modelo estatístico utilizado. Isso pode sugerir fortemente que os percentuais foram definidos anteriormente e os números de votos foram ajustados para coincidir com esses percentuais, levantando suspeitas sobre a legitimidade do processo eleitoral.
“Os números de votos que foram divulgados foram exatamente às porcentagens divulgadas: 51,2%, 44,2% e 4,6% do total de votos (após arredondar para um número inteiro). Ocorre que essas porcentagens eram arredondadas para uma casa decimal e nesse caso essa coincidência é bastante extraordinário, considerando um total de cerca de 10 milhões de votos. Se os números fossem legítimos, esse coincidência teria uma probabilidade da ordem de 1 em 10 milhões ou de 1 em 100 milhões, dependendo do modelo usado para o cálculo. isso sugere fortemente que essas porcentagens com uma casa decimal foram inventadas e aí os números de votos correspondentes foram calculados”, afirmou Tausk.
Por sua vez, o jornalista Mowszet sugeriu que, em vez de os percentuais terem sido calculados a partir dos votos reais, parece que os votos foram ajustados para se encaixarem nos percentuais previamente decididos, diminuindo uma possível manipulação dos resultados eleitorais.
“Há duas opções: ou é uma feliz coincidência matemática daquelas que nós, nerds, adoramos, ou, por outro lado, para calcular a quantidade de votos que iriam receber a cada um [dos candidatos] (de acordo com os percentuais já decididos anteriormente), eles fizeram as contas com uma calculadora”, disse o argentino.
Em uma publicação feita em sua conta no Facebook, o professor Tausk reafirmou que os números divulgados pela CNE são estatisticamente improváveis e isso levanta fortes suspeitas de fraude.
“É verdade mesmo que esses foram os dados divulgados oficialmente pelo TSE da Venezuela [o CNE] então fica meio difícil negar que isso é uma fraude. A única outra explicação que eu poderia aceitar é um erro na divulgação, tipo: alguém digitou numa planilha as porcentagens arqueadas e calculou os números de votos correspondentes em vez de digitar os números de votos corretos e depois calcular as porcentagens”, escreveu ele.
“[…] Tem uma estratégia tosca de fraude que geraria esse tipo de resultado com certeza: a pessoa que quer fraudar inventou primeiro as porcentagens 51,2%, 44,2% e 4,6% (com uma casa decimal, como normalmente divulgadas, e somando 100%) e aí calculou os números de votos correspondentes aplicando essas porcentagens ao total de votos 10.058.774 (e depois arredondou para um inteiro)”, escreveu Tausk na mesma publicação.
Em meio ao cenário de caos, a oposição venezuelana continua a denunciar o que considera uma farsa eleitoral e tem sido divulgada como atas que conseguiram obter das eleições eleitorais para sustentar suas reivindicações de que González foi o verdadeiro vencedor da disputa presidencial em muitas regiões. Entretanto, a CNE ainda não divulgou nem permitiu que entidades independentes consultassem as atas das eleições.
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