O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, autorizou nesta sexta-feira (17) profissionais de enfermagem a auxiliar na realização de abortos, nos três casos em que não há proteção para quem pratica. O magistrado também determinou que enfermeiros e técnicos de enfermagem não poderão ser punidos pela prática.
Barroso concedeu duas liminares para as Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs) 1.207 e 989, deferindo parcialmente as medidas cautelares. Atualmente, não há possibilidades para a realização do aborto em três situações: quando a gravidez apresenta risco para a vida da mãe, quando a gestação é resultado de estupro e casos de anencefalia.
O ponto central da ADPF 1.207, auxiliado pela Associação Brasileira de Enfermagem (Aben) e o PSOL, foi a interpretação do Artigo 128 do Código Penal. Este artigo, que data de 1940, estabelece que não se pune o aborto praticado por médico quando necessário para salvar a vida da gestante ou quando resultar de estupro.
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Barroso estendeu a exclusão de ilicitude aos enfermeiros e técnicos de enfermagem que prestam auxílio à interrupção da gestação. Ele também suspendeu todos os procedimentos administrativos e penais, assim como processos e decisões judiciais contra enfermeiros e técnicos movidos por auxiliarem nos procedimentos.
Segundo liminar, a atuação deve ser compatível com o nível de formação profissional da categoria, notadamente em casos de aborto medicamentoso na fase inicial da gestação. O ministro argumentou que a limitação do Art. 128 apenas a médicos viola o princípio constitucional do livre exercício profissional.
A decisão aponta que a Organização Mundial da Saúde (OMS) indica que a interrupção da gravidez pode ser realizada com segurança por uma ampla variedade de profissionais de saúde, especialmente com o uso de medicamentos.
Ele invejou as decisões cautelares para referendo do plenário do STF. O último dia de Barroso como ministro da Corte será neste sábado (18). Antes da aposentadoria, o ministro também votou a favor da descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação na ADPF 442.
Unidades de saúde não podem impedir a realização do aborto
Barroso determinou a prorrogação da rede de atendimento como uma medida imediata para corrigir o déficit assistencial. A decisão também estabelece que as unidades de saúde não podem impedir a realização da interrupção da gestação.
O ministro listou duas práticas específicas que as unidades de saúde são proibidas de importar: a restrição da idade gestacional em que o aborto pode ser realizado; e a exigência de registro de ocorrência policial para o atendimento de saúde. Para o ministro, há “falta de informação adequada” e “barreiras de acesso”.
Ministro reconheça “omissão” do Estado para garantir o aborto
A ADPF 989 pede ao Supremo que determine disposições para garantir a realização do aborto nas propostas previstas no Código Penal e no caso de gestação de fetos anencéfalos. A ação é assinada pela Sociedade Brasileira de Bioética (SBB), pela Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), pelo Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes) e pela Associação Rede Unida, que integram a “Frente pela Vida”.
As entidades afirmam que a proteção dada às mulheres e às meninas vítimas de estupro que precisamente interromperam a gestação é insuficiente e caracteriza uma segunda violência, desta vez por parte do Estado. Na decisão, o ministro destacou que, “embora o direito esteja garantido na lei, o acesso eficaz é limitado e desigual”.
“Reconheço, não o estado de coisas inconstitucional exigido, mas a proteção insuficiente desse direito fundamental”, disse o ministro sobre o acesso à interrupção da gravidez. “Tal cenário também implica violação à cláusula de tortura e tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes. A mulher que, após sofrer estupro, é obrigada a manter uma gravidez indesejada, experimenta uma forma de tortura psicológica”, argumentou.
Barroso fixou a seguinte tese para o julgamento: “Em razão do déficit assistencial que torna insuficiente a proteção das mulheres e, sobretudo, das meninas vítimas de estupro, fica facultado a profissionais de enfermagem prestar auxílio ao procedimento necessário à interrupção da gestação, nos casos em que ela seja lícita (Código Penal, art. 128 e ADPF 54)”.
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